16.5.13

Verdades guardadas

Isadora Garcia

Choro a iminência da descoberta
Segura me sinto, cá, encoberta
Teus olhos vendados são mais felizes
Teu coração guardado das cicatrizes

A cena final

Isadora Garcia

    Cada ponto final era como uma facada, cada vez alcançando espaços mais íntimos nas entranhas da velha. Era a última vez, ela sabia. Não haveria um próximo encontro, não haveria mais futuro, não haveria mais nada, era o fim. Não estava preparada para o adeus ainda, ela repetia, enquanto seus olhos, já embaçados pela emoção, deixavam escapar uma lágrima, única representação verdadeiramente física de seu sofrimento. Mas não havia mais como desistir, o acordo estava feito e este era o momento do adeus. As dores das feridas ardiam e matavam a escritora por dentro. Ela não podia parar, ou não chegaria ao fim, tinha consciência de sua limitação. Era pouco o ar que chegava a seus pulmões, estava morrendo. Morria junto com o fim da história que escrevia. Não era um fim como os outros, ah!, não era! Este fim marcava, também, o término de uma vida conjunta, de um amor incompreensível a corações humanos. A velha amava aquele homem com mais intensidade do que saberia explicar. E o fato de que dela dependia a existência dele queimava por dentro. Ele só morreria por causa dela, era tudo sua culpa. Seu corpo tremia. Estava ponto um fim à vida de ambos. A velha morria por matar seu personagem e ele morria em virtude da morte de sua criadora. Não havia alternativa, não havia saída. Ela soluçava. Seu sangue encontrava dificuldade para percorrer o caminho até seu coração. O barulho das teclas acompanhava as facadas que lhe tiravam a vida. Chegara a cena final do último dos romances figurados pelo vilão. Ele já avistara sua vitma: parada, sentada diante de uma máquina de escrever. Este seria o último assassinato, seria o golpe definitivo, mataria vitma e vilão, estranhamente misturados em seus papéis. O homem já estava próximo o suficiente, sedento por sangue, quando percebera que sua presa chorava, consciente do próximo evento. Mas isso pouco lhe importava. Este era seu destino, este era seu ofício. E com um último suspiro, a velha escreveu o ponto final.